Salamonde

Maria Do Carmo

A lã, matéria-prima de excelência, teve um papel dominante na sustentabilidade económica de muitas famílias das aldeias de Vieira do Minho, vindo a perder essa importância, por volta dos anos de 1950/1960.

A Serra da Cabreira foi, desde sempre, local de pastoreio, rebanhos de cabras e ovelhas, organizados em “vezeiras”. Saíam ao toque do “cornato” (chifre de vaca transformado em buzina), de manhã, rumo à serra e regressavam à noite, para se protegerem do frio e dos lobos. Era este um ritual bem conhecido dos pastores de Salamonde, e esta organização comunitária, com calendário bem definido de “dias de vezeira”, de acordo com o número de cabeças que possuíam, permitia que os proprietários dos rebanhos programassem as suas tarefas quer agrícolas, quer sociais.

Nos rebanhos mistos, as cabras produziam leite, forneciam carne (cabra e cabrito são dois deliciosos produtos gastronómicos locais), mas também “limpavam” a serra dos matos mais bravos, e as ovelhas, menos bravias, alimentavam-se de plantas mais tenras, produziam leite e carne e forneciam da lã que era aplicada na produção de cobertores (tecidos em Barroso), meias, meiotes, “peúcos” (meias sem pés), camisolas e até aventais.

O trabalho da lã, como forma de artesanato, tem vindo a ganhar uma nova dimensão e os rebanhos de cabras e ovelhas, como forma de atividade económica, estão de novo em crescimento, e, com esta simbiose, poderá voltar a ver-se nas aldeias de Vieira do Minho a produção artesanal de artigos tão tradicionais e tão específicos.

Da tosquia, realizada normalmente em maio, aproveitava-se a melhor (a lã mais comprida e mais limpa) que, para chegar ao produto final, passava por ser “escardufada” (aberta), cardada, fiada, torcida, enovelada e depois dobada em meadas para ser finalmente lavada e, se necessário, ser tingida. Após todos estes passos, surgia a lã como produto final para ser transformada em peça de vestuário que as mesmas mãos sábias iriam produzir.

Cada peça de vestuário cumpria um objetivo: para uso no trabalho do dia-a-dia podia ser feita a partir da lã mais natural possível, pois nada garantia que a cor do fio mantivesse a mesma gradação do início ao fim da meada; se era para uma peça de roupa de uma criança (meias ou camisolas) já a lã meirinha era a selecionada, pois era mais branca e a mais macia; caso se tratasse de umas meias para um ato mais solene, ou para oferta a algum “senhor”, e se quisesse uma peça bem escura de um tom único, costumava usar-se tingir a lã.

O processo usado para tingir a lã foi também aperfeiçoado, ao longo dos tempos, e, se no início se conseguia uma cor pouco uniforme, quando se colocava a lã no pote a ferver com cascas de cebola para que ficasse amarela/bege, quando se queria obter uma peça com a cor preto firme colocava-se a lã a ferver, juntamente com um ou mais chapéus velhos (chapéus de feltro) que os homens já não usavam, e a cor desses chapéus, quase sempre pretos, tingia a lã de uma forma perfeita.

Mudam-se os tempos e surge a vontade de conseguir que a tradição não se perca, pois são muito poucas as pessoas que fazem o aproveitamento desta matéria-prima, não porque ela não exista, mas porque o saber fazer, de forma tradicional, está em desuso e a facilidade em adquirir produtos similares está muito mais ao alcance de todos.

Autor do texto: Antonieta Machado