Vilar Chão

image - Manuel dos Santos -

Todas as terras e todos os povos têm os seus ícones e símbolos emblemáticos. Da comunidade de Vilar Chão, outras podiam ser as imagens de marca (Torreão do Sino ou o Penedo da Pinga ou, em registo menos material, a sua Banda Filarmónica). Mas, não menos representativa é esta do seu Lagar de Azeite, adquirido, em 24 de setembro de 1905, para uso comunitário, pelo Presidente da Junta de Paróquia, Padre João Baptista Vieira, com a condição de fornecer anualmente à Igreja três cântaros de azeite, para a manutenção da Lâmpada do Santíssimo e outras despesas da mesma Igreja.

Dir-se-ia que, aos quatro elementos cosmogónicos, identificados pelos fisiólogos gregos – terra, água, ar e fogo – seria necessário agregar um quinto elemento: o azeite. O pão, que o povo de Vilar Chão penosamente arranca da terra que lhe coube em sorte, encontra na azeitona, ripada ou varejada das oliveiras, dispersas pelas bordas dos campos ou concentradas em olivais, o azeite quente das lagaradas que neste engenho se processavam, condimento de delicioso manjar, servido em saboroso e saudoso convívio e condimento apetecido na mesa frugal das casas familiares da comunidade.

O que nesta imagem observamos é apenas um elemento de um puzzle. Moída a azeitona neste moinho, também chamado pio ou dorna, o bagaço é transferido para as seiras, das quais escorre o azeite e a água quente nas mesmas seiras vertida, previamente aquecida em caldeira de cobre da fornalha. A água-ruça cai nas tarefas, primeiro na mais funda, de cerca de 1 metro de profundidade, onde o azeite se vai apurando, e logo, limpo, na tarefa mais pequena.

A mistura de azeite e água sai das seiras pressionada pelo peso da vara, movida pelo conjunto articulado do fuso, encaixado superiormente na concha da vara e inferiormente no pouso, movido pelos Lagareiros.

Anote-se que, os agricultores que não tinham Prensa para espremer o bagaço das uvas, recorriam à Prensa do Lagar, onde, com dificuldade, prensavam o bagaço nas mesmas seiras, cuidadosamente lavadas, onde era prensada a azeitona.

Esta imagem tem, evidentemente, denotação económica. Mas, a economia não é tudo. Olhando para esta roda, em penoso movimento imaginado, vem-nos à memória muita vida, trabalho duro, marcas de sofrimento, de outro tempo e outro modo de estar no pequeno mundo desta comunidade.

Este homem, de olhar distante, de seu nome Manuel Pereira dos Santos, de 92 anos, de outra terra natural, mas desta singular habitante, pode bem ser o símbolo da memória, o álbum das recordações e das gerações que, como roda giratória sobre o eixo da memória, incessantemente se sucedem no moinho da história, como pode bem ser o símbolo do emigrante, a outra terra chegado, e na saudade sentado, recordando passados sombrios e futuros iluminados.

Autor do texto: José Marques Fernandes